Os donos da rua
12/05/12 17:23É uma pequena história pessoal que resume e explica um pouco o estado das coisas no Brasil.
Moro no Rio de Janeiro. E são comuns, por aqui, prédios antigos, sem vagas de garagem.
O prédio onde moro até tem algumas vagas, mas insuficientes para todos os apartamentos. O meu, por azar, não tem.
(Sim, é algo estranho para quem vem de São Paulo. No meu prédio no Ipiranga, por exemplo, eu tinha três vagas. Mas com o tempo percebi que são apenas estilos diferentes de vida. Meu prédio aqui também não tem varanda gourmet ou salão de festas ou churrasqueira ou piscinas. Mas é charmosinho. E perto da praia. Enfim, cada um tem seus prós e contras. E vamos levando…)
Ocorre que, desde que mudei para este prédio, em dezembro, eu vinha alugando uma vaga por R$ 350 mensais. Absurdamente caro, não? Pois um dia achei o mesmo. E, como minha rua é bastante sossegada, bucólica, daquelas de parar o carro debaixo da própria janela, decidi que era hora de economizar esses trocos.
Os problemas começaram na terceira noite em que estacionei ali. Um rapaz vestindo uniforme de uma empresa de segurança veio até o carro e me abordou. O diálogo foi mais ou menos assim:
Ele: “Boa noite, senhor. A gente faz uma trabalho de segurança aqui na rua e se responsabiliza por uns carros…”
Eu: “Vocês se responsabilizam? Como assim? Se roubarem meu carro vocês me dão outro?”
Ele: “Não, senhor…”
Eu: “E se riscarem meu carro, vocês consertam?”
Ele, já meio assustado: “Não, senhor… Mas a gente cobra R$ 70 por mês para olhar os carros…”
Eu: “Então deixa. Não tem problema, vou continuar parando aqui.”
Era só o início dos problemas.
Outro empecilho para minha ousada decisão de parar o carro na rua onde moro é que toda a zona sul do Rio está loteada para vendedores de talões de estacionamento.
Em São Paulo, você compra um talão na banca de jornal e pronto. Aqui no Rio, não. Os tais vendedores de Área Azul, de uniformes, atuam como donos do pedaço. São uma máfia.
Não muda muito minha vida no dia-a-dia porque saio de casa às 7h30 e, quando volto, o cartão não é mais exigido. Mas, nos finais de semana, é um transtorno. Duas horas de estacionamento custam R$ 2.
Descobri, então, que existe um tal “Cartão Morador”. Liguei para a subprefeitura, me passaram um número da CET-Rio. Liguei mais de 20 vezes, sempre tocando até cair. Desisti, fui procurar informações na internet.
Bom, é como se o cartão não existisse, tamanha a lista de exigências burocráticas para obtê-lo. Eu, morador do Rio, não posso ter o Cartão Morador porque meu carro está em nome de pessoa jurídica. O que isso muda no fato de eu morar naquele endereço e precisar parar o carro em frente de casa, não sei.
E a burocracia, amigos, é indobrável. Desisti do Cartão Morador e passei a gastar dinheiro com cartões de Área Azul sempre que necessário.
Até que resolveram recapear minha rua. Surpreendente. É um bairro bacana do Rio, o asfalto parece uma mesa de bilhar.
Imagino que bairro mais humildes tenham centenas de ruas precisando de recapeamento. Mas, não. Resolveram refazer o que já estava bom, típico show pré-eleitoral para a classe média.
O serviço era feito de madrugada e, por três noites, para não ter o carro rebocado, tive de procurar outra rua para deixá-lo dormindo.
Na primeira, deixei-o num estacionamento. A conta para o pernoite: R$ 45.
Na segunda noite, parei numa rua. Idem na terceira. Na manhã seguinte, 7h30, indo trabalhar, adivinhem?
Eu estava já ligando o carro quando surgiu um vendedor de Área Azul com seu indefectível colete de “dono da rua”. Com toda a prepotência do mundo, já veio fazendo sinal para eu abaixar o vidro, como se ele fosse alguma autoridade.
Era manhã, o dia estava lindo, eu ainda estava de bom humor. Abaixei o vidro. O diálogo foi mais ou menos assim:
Ele: “O senhor mora aqui na rua?”
Eu: “Não”.
Ele: “Pô, o senhor tá parando o carro aqui.”
Eu: “E daí?”
Ele: “E daí que o senhor nem me deixou uma moral.”
(Imagino, eu, que seja um sinônimo para dinheiro, caixinha, grana.)
Eu: “Que moral? Tô saindo às 7h30.”
Não falei mais nada. Já estava puto, meu dia já tinha ficado ruim. Saí acelerando, sem acreditar na arrogância do sujeito. Não voltei a parar lá, até porque terminaram o teatrinho do recapeamento na minha rua. Mas imagino que não seria bem-vindo se o fizesse.
O último lance da história aconteceu ontem. Na véspera, deixei o carro na minha rua, em frente ao meu prédio. Bem ali, onde um segurança pediu _e não levou_ R$ 70 para “se responsabilizar” pelo veículo.
Quando fui pegá-lo, de manhã, havia um pedaço de ferro enfiado na fechadura. E um risco na porta, de ponta a ponta.
Sugeriram-me que eu pagasse os R$ 70 pros seguranças. Não, não vou fazer. Agora que não vou mesmo.
Não posso afirmar que foram eles. Mas eles passam as madrugadas ali. No mínimo, fizeram corpo mole. Usando o raciocínio inverso, duvido que meu carro estivesse riscado se eu tivesse pago o que pediram.
Mas ok. Podem riscar meu carro todo. À vontade. Não vou pagar.
É isso, enfim. No Rio _e em outros lugares do Brasil, imagino_, um cidadão não tem direito a parar o carro na porta de casa.
Na zona sul do Rio, ou você é achacado por seguranças privados ou por estacionamentos a preços extorsivos ou por vendedores oficiais de Área Azul ou pelas burocracia sem sentido da prefeitura. Não há o que fazer, não há para onde correr.
A solução mais básica, parar diante de casa, não existe.
Se você tem um carro e mora num prédio sem garagem, seu orçamento pessoal precisa ter uma rubrica “propina” ou você corre o risco de danos ao seu patrimônio.
Um monte de gente convive com isso. E acha normal. E paga. E se submete. E tudo vai se eternizando. E os caras vão se legitimando como donos da rua.
E assim, em milhares de casos corriqueiros como este, em várias e várias situações cotidianas parecidas, todos vamos nos afundando na lama.
Ou pior, no lixo.
Trata-se de uma questão cultural, o brasileiro é um povo corrupto por natureza, vota em corruptos pq se corrompe facilmente, “nós” adoramos uma molezinha…aí vem a questão!
Se os caras lá de cima podem, pq eu morador da baixada ou da favela não posso? Cada um em seu nível! Teste: Vc tomou uma multa pq estacionou 1 minuto em frente a papelaria, um amigo te oferece pra tirar a multa fácil, vc aceita??? Responda sinceramente pra vc mesmo???
Isso é o povo brasileiro amigo!!! Potência? Jamais….enquanto não miscigenar melhor…
Miscigenar…. Pra dar uma “clareada” na população, né? Comentário bem típico de neonazista…
Respondo sinceramente para você: Eu não aceitaria. E conheço outros que não aceitariam.
Não sei o que leva uma pessoa a generalizar de maneira tão radical. Mas eu lamento muito por você.
Eu ja passei por isso tantas vezes em Sao Paulo… Ano passado sai para almocar do escritorio que trabalho na Faria Lima e a 1 da tarde, Leopoldo Couto com Faria Lima, tive uma arma na minha cabeca e um cidadao pedindo meu relogio (pela marca do relogio…).
Tive um carro roubado porque nao paguei propina pra flanelinha. 1 mes depois aceitei uma proposta pra vir para a Europa a trabalho e ca estou ha 1 ano.
O que nao alivia em nada minha dor.
meu palpit para a corrida sera.
alonso/vettel/raikkonen
Parabéns pela atitude Fábio. Muitos podem até criticar lhe rotulando como o cara que quer mudar o mundo. Mas, são através de atitudes como a sua que podemos de alguma maneira mudar o estado de coisas em que vivemos. Um país sem lei, onde os espertos se julgam proprietários da nossa vontade, ditando regras e estabelecendo a forma como devemos nos reportar a eles.
Caro Fabio Seixas.:
A pura realidade é que: As grandes cidades e as com bom número de habitante estão enfrentando o que hoje não passa de certeza de uma politica antiga donde os governos não se preocuparam com o grande número de carros e com a propriedade expandindo , não deu outra : como solucionar um problemão que é hoje a mobilidade urbana. Os engenheiros de trafigo estão quebrando a cabeça, pois o imenso volume de automoveis cresceram vertiginosamente. Então como solucionar o problema de espaço, porque as ruas deveriam ficar livres , por serem estreitas e o objetivo sempre será o rolamento do transito certo. Crescimente desordenado e estruturas antigas fazem aumentar caos
Pode parecer estupidez , pois o investimento seria muito alto mas aqui vai
um palpite: porque não criar um grande Shopping para estacionamento? um hectare relativamente são 10.000 m2 , bem média um carro larg 2m x comp 3m= utilizaria 6m2 por espaço certo? totalmente contruido cada andar iria utilizar com espaço legal e area de circulação caberiam por andar mais ou menos 1.000 veículos , lógico tem que ser feito por engenherios certo . É apenas um palpite mais com certeza dá para ser pensado a curto prazo , tanta obra inutil quem sabe está possa ser um asolução? abraços
Faca uma reportagem sobre a sua rua, o flanela covarde e imbecil e todo o sistema máfia que e o “loteamento” de vagas. Ou se vc quiser posso resolver para vc rapidinho, me pague minha passagem de ida e volta mais pernoite num hotel.
Desolvo em duas horas, agindo na lei, nao sou político, mas eu prometo.
Parabéns por sua coragem e retidão. Certamente a corrupção não é um fenômeno restrito apenas ao governo no Brasil. A corrupção enncontra-se entranhada em todos os setores da sociedade. Obrigar alguém a pagar para “olhar” o carro é um exemplo de corrupção. Mas todos se esqueçem que se eu pagar pelos tais “serviços” também estou sendo corrupto. Não é somente o ladrão o criminoso, mas também o receptador da mercadoria roubada. Dessa forma, também aqueles que “pagam” para ter uma noite tranquila, também estão sendo tão ou mais corruptos que os que oferecem tais “serviços”. Os tais corruptos que pagam para não terem problemas, não denunciam, não se unem contra, não tomam qualquer atitude em nome da retidão ou da honestidade e ao pagarem estão, na verdade, vendendo a sua honra e apenas ficam gritando aos quatro ventos as possíveis atitudes a serem tomadas por nossas autoridades.
Mais uma vez, sua atitude é louvável e digna ! ! !
Interessante esse seu post. Quando compararam o Brasil ao Bahein você se sentiu ofendido. Este aqui é um país de bandidos. Não tem jeito.
Não me senti ofendido. Apenas discordei de algumas comparações. E uma situação não tem nada a ver com a outra.
Abs
Nem sei por que tanta frescura.Há tantos problemas graves no Barsil e gente fica fingindo viver no outro paneta.
É por essas e outras que eu me mudei pra Europa…
Não tem condições esse país.
E olha que eu até gosto, mas é difícil demais aguentar isso em todo lugar.
É muita corrupção no governo, o qual por sua vez é um reflexo dessa sociedade podre, a começar pela ex-capital RJ.
E isso irradia para o resto do BR, infelizmente.
Falta educação!!!
Por isso decidi morar fora do pais, no brasil ninguem te ouve, mas com dinheiro as coisas mudam. vegonha
Encontrei um cara que pensa como eu. Podem arranhar meu carro, não pago extorsão de jeito nenhum!!!!
E ainda tem quem acha esses caras uns coitadinhos… Aqui em Goiânia tá este inferno também… Só pra vcs terem uma ideia vou contar algo absurdo:
Uma mulher aqui de Goiânia, já idosa, vive de olhar carro. Após algumas denúncias da população, uma equipe de reportagem resolveu seguir a mulher com uma câmera escondida.
Bem, simplesmente filmaram ela no final de cada dia indo até um beco escondido, onde havia um Corolla zerado esperando ela, ela tirava as cobertas de mendigo e entrava no carro!
Seguiram a mulher, e descobriram que ela possuía 3 imóveis em seu nome e carro no seu nome!!!! E isto porque ela cobrava só 5 reais pra dar uma olhadinha….Imagina estes que cobram 50, 70, 100….
Façam as contas no caso de pedinte em semáforo: Um semáforo fica aberto em média um minuto. Suponha-se que no mínimo o cara tire 20 centavos a cada parada. Agora vamos lá: R$ 0,20 x 60min x 8 horas = R$ 96,00 ao dia!!! Arredondando pra R$ 100,00, dá R$ 3.000,00 no fim do mês!!!! Agora imagina se um bom samaritano no semáforo resolve dar R$1,00, R$ 10,00, ou até R$ 50,00, como já vi…
Casos como este de flanelinha que lhe obriga a pagar sob pena de danos no veículo é chantagem, extorsão. Brasileiro é muito acomodado e não faz protesto, não corre atrás dos seus direitos. Acho importante iniciativas como esta do Fábio e do Flávio Gomes, chegou a hora da imprensa em peso denunciar, e fazer matérias investigativas sobre o assunto.
Isto é coisa que só acontece no Brasil. Se fosse nos EUA, já já apareceria algum dono de veículo psicopata estilo “Um dia de fúria” e sairia pregando bala em flanelinha que lhe tentasse extorquir. Aqui no Brasil, a extorsão ocorre na frente da polícia, onde a gente vê o flanelinha “loteando” a calçada, e um carro da polícia do lado assistindo de camarote….
Olá Fábio!
Eu fico indignado com o simples fato de pedirem pra ‘vigiar’ meu carro. Fiquei mais ainda com o seu caso, é um absurdo! Admiro você, acho que se todos nós fizéssemos o mesmo não existiriam os flanelas e adjacências.
A polícia será que pode fazer algo? Já pensou nisso?
Abçao
Excelente. O texto e a atitude.
Faz um seguinte. Calcule o valor que vc gastaria por mês com a linha azul e inclua esse valor em um possível novo aluguel. Um aluguel de um apartamento com garagem. Vê se isso cola e manda esses caras pastá.
Pesquise. Já que mensalmente é tão caro assim a linha azul.
Ou melhor. A garagem por 350.
Dê dinheiro para vc e, não para eles, nesse caso.
É revoltante Fabio, e o pior que os caras se reelegem, cade nosso dinheiro dos impostos, a policia…
É isso aí Fábio, bela atitude. Um dia isso tem acabar!
Revoltante, espero que a repercussão do texto mude essa situação ai no Rio.
Você faria o mesmo se o carro fosse seu e não da empresa?
O carro é meu.
Abs
Esse e o Brasil…
A sua atitude é corajosa Fábio, mas confesso que, estando no seu lugar, pagaria, mesmo tendo a consciência de que estou agindo errado. É muito transtorno que você tem que passar pra peitar esses caras, esses esquemas, sem nenhum amparo do Estado. Resumindo: Zona total
Parabens pela coragem do texto. Parabens por fazer esse texto. É a verdade do Rio de Janeiro. O meu carro tambem já apareceu com um risco desse e eu garanto: Foi o porteiro vizinho ou o segurança. Depois que eu falei que iria ao process ou a caça, nunca mais fizeram. A dica: Chama o responsável pela segurança e conversa com ele ou vai logo na prefeitura e manda eles resolverem.
Nas portas de boate é pior ainda amigos.
Decerto o carro pertence à empresa o qual o jornalista está vinculado, talvez, por esse motivo, não seja muito precavido com o bem material que NÃO LHE PERTENCE.
Porque, geralmente, as pessoas se cercam de mais cuidados com coisas que lhe pertencem, ainda mais um de alto valor. Posso não concordar, até ficar revoltado, mas não deixaria de pagar 70 reais para o “segurança”, caso o carro me pertencesse. Porque, certamente sairia mais caro, afinal isso é Brasil, um “país de tolos”.
Veja bem, concordo e compreendo a indignação do jornalista. Mas, acho eu, que se o carro lhe pertencesse ou à algum familiar, o jornalista pagaria. Indignado, mas pagaria.
Doe R$70 à campanha do Marcelo Freixo.
Faça como eu. Vá de ônibus…
O que esperar de um estado e uma cidade onde o Sergio Cabral ganha eleição?
Sem ofensas, me desculpe mas não acredito nisso. Todos sabemos que Lulinha, nosso líder e salvador, transformou o Brasil no paraíso na Terra e essas coisas não acontecem. Aconteciam 9 anos atrás, hoje não mais.
A única explicação que existe é que houve algum fenômeno natural que riscou seu carro.
Agora, se este fosse um país como os que se dizem desenvolvidos, mas não são, vc deveria processar a prefeitura. As ruas não são públicas? O Estado não deve garantir a segurança de todos? Então. Se eles não conseguiram pegar o cara que fez isso com seu carro, eles que paguem o prejuízo ou provassem que vc estaria de má fé. Querer só as mamatas de arrecadas impostos eu tb quero.
O que esperar de um pais onde o pt vence até eleição presidencial? Três vezes seguidas.
Por estas e por outras que ainda prefiro viver na caótica São Paulo. Ainda as instituições funcionam razoavelmente.
Morar no Rio ? Não obrigado !